Relembrando o passado "pretérito imperfeito" exercício constante.


Entre os nove e dezesseis anos o meu universo pessoal girava em torno de algumas idiossincrasias comuns a comunidade, mais especificamente tribo urbana a que eu pertencia. Essa tribo é a dos garotos do subúrbio, ela é gigantesca pela própria identidade geográfica que assume, mas que em cada canto desse espaço, em cada realidade, vivência e contexto. Apresenta peculiaridades distintas uma das outras. Para quem é da periferia e tem uma banda de rock, esse é o período da vida que determina toda a sua existência. Estive pensando nisso, e por isso resolvi escrever essas peculiaridades da tribo suburbana a que pertencia. A dos garotos pobres, marginalizados e pseudopunks, das diversas identidades que essa denominação pode assumir, a minha é exatamente a do Punkabilly.



Havia uma lista infinita de bandas que rockeiros gostavam, sejam elas punks ou clássicas, de Queen a Guns n' Roses, de Ratos de Porão a Sepultura… mas as duas bandas mais representativas da galera eram Ramones e Motorhead. Podendo até causar brigas entre quem discordasse de seus tronos absolutos. Bandas billys que fizeram minha cabeça como Straycats e Dr. Feelgood, andavam era longe de ser unanimidade. Os automóveis eram em sua maioria carros populares da Volkswagem, tipo o Fusca Baja, esportivo, o próprio Fusca e a Brasília… tinha também o Puma GT que seria totalmente fora dos nossos padrões assim como o Maverick, e o Fiat 147 nos trazia de volta a realidade. Motocicletas tinham que ser Yamaha, RD 135 Viúva Negra ou DT 180. Sonho fora de realidade, pero no mucho, seria uma Agrale Elefantre ou a Honda NX. Que porra de punks são esses tão dentro da sociedade de consumo. Estou falando de uma época em que o luxo dos mauricinhos eram os Kadets, os Escort XR3, Monzas…. Honda XL e NX… e as bandas seriam Europe e Roxete. Que também são boas, maravilhosas, mas no conceito da tribo não tinham nada a ver.





Não havia celular e nem internet no nosso meio, gostávamos de revistas em quadrinhos e discos de vinil. Videogame era em locadoras e sexo era sem informação e muitas tantas vezes sem camisinha. Namoros duravam duas semanas e livros eram compartilhados de amigo a amigo, como também fitas K7 eram distribuídas, e o sonho das bandas era gravar uma fita demo. Para a minha turma, em uma visão mais fechada ainda da tribo, Jô Soares, Angeli, Millôr Fernandes, Casseta & Planeta, Zé do Caixão, Fernando Gabeira… eram os intelectuais interessantes. Notem que nesses que citei só José Mojica marins e Gabeira não são humoristas. E o máximo era poder sair de casa aos fins de semanas para bailes de equipes de som ou curti as praias do Náutico ou da Barra do Ceará.






Essa é também a geração das gangues, da pichação que é uma linguagem gráfica legitima do underground e que só iniciados entendem. É a geração das drogas baratas tipo cola-de-sapateiro e da violência suicida de pseudoesportes que desafiavam os limites do perigo como o surf ferroviário e rodoviário. A violência descabida, alienada e alarmante também é uma característica dessa geração. Quantos inocentes morreram em vão no meio dessa panaceia de horrores. No geral o rock nacional vai perdendo espaço para outros ritmos apoiados por uma mídia vendida e descompromissada, onde a idiotice e a exposição sexual garantem o sucesso para alienar uma grande horda de imbecis e a gente vê migrar para esse grupo cada vez mais pessoas. Até quando o momento socioeconômico vai ficando favorável e uma espécie de amnésia coletiva toma conta de quase toda a maioria. Você vai ficando adulto e cada vez mais cético, sobra só a lembrança daqueles tempos de Super Aventuras Marvel, Fuscas e RDS Viúvas Negras almejadas ao som de Ramones e Motorhead.




                                   



















valeu. Georgiano de Castro.

Comentários

  1. Muito boa essa "viagem no tempo"... me identifiquei muito com seu artigo, afinal, sou da mesma época em que compartilhávamos as mesmas ideologias, mesmas bandas, mesmas tribos. Fugi da regra comum por poucos anos, me revoltei biologicamente, coisa de adolescente, fase passageira, mas experimentei algumas aventuras proibidas como a pixação. Fui da trupe dos psicopatas da madrugada (PM)e da esquisitofobia (SF). Partcipei de bandas de rock. Trocávamos do nirvana ao ultraje a rigor, por estranho que pareça, ainda tenho essas bandas em minhas veias, letras bem trabalhadas e a crítica latente em suas entrelinhas... Belo texto. Se eu fosse reverenciar cada detalhe, ficaria horas digitando.

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